A repetição

No dia um
senti o revolver
condenar-me a saltar,
não da prancha, mas
para um buraco no chão,
a seguir um coelho branco
para lhe pedir a medicação.

No dia um
empurraram-me,
prenderam e torturaram-me
para ver se me comporto,
ofereceram um comprimido azul
e não hesitei em saltar
de volta para o buraco
(alguém me tira daqui vivo?).

No dia um
apresentaram-me à memória
e não foi um prazer
ver o inimigo número um
olhar para me ver chorar
repetir para me ver chorar
eu não sei o que dizer
eles não sabem o que fazer
o silêncio na mente,
a dormência da vontade,
a repetição, em repetição,
das reticências da acção
são o engenho da melodia
que chicoteia e cicatriza
sem sarar a agonia
das copas destes cogumelos
que pagam as dívidas
a um exército de cartas
que entregam a justiça poética
de um 1984 babilónico.

Não importa, não importa
o dano está feito.
Ai importa, pois importa,
vocês é que apertaram o gatilho.
O quadro que vocês repetem
é tortura para mim,
a vossa lengalenga é tortura
que repetem para mim.

O meu inimigo é a saudade
desde aquele dia um
(colem um 112 à língua,
ver o paraíso num selo,
e mandem outro logo a seguir).

No dia um
acordei e estendi a mão
aprendi as línguas de fogo
para escrever o livro a ferro,
não inspirei o fumo da lagarta
usei o meu nervo para furar o cenário
e pedi com gentileza para sair.

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