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A mostrar mensagens de maio, 2013

Canto de Cisne

Semelhanças dissidentes, Para uma ética da finitude, A Higiene mental de se ter um fim E de nos cingirmos à mortal humanidade. Resíduos de tristeza saltam eras, Os cisnes ambientam o antigo e o novo Na sua impreterível ruína. O culminar vai deixar-nos de rastos, O pico de tudo e todos e a prova do que somos Vai deixar-nos relutantes a um continu-ar.

As Luzes Cegam-me

Havia um sub-tom mortal na sua voz: uma clave ou duas que choravam. As sílabas pareciam rastejar-lhe da boca para fora, como se tivessem noção das próprias bestas sub-reptícias que seriam. Certamente soubera como a noite se lhe prostituira, como os valores se viram derreter à luz da vida nas sombras. E como todos só queria a perfeição: qualquer que fosse a sua fruição ou representação. Seria isto?, poderia a prova ser a cristalização, o cúmulo ou pique do nojo? As palavras continuavam a vomitar-se-lhe sem ninguém para as ouvir ou limpar - porque eram sujas: Só vivi... só vivi às escuras. As luzes doíam na vista. Quem me dera recuar, quem me dera voltar ao momento a que fui dado à luz, para lhe aprender a sobreviver. Agora sinto o sangue corroído da cegueira, como se o coração pulsasse insegurança, frio e ubiquidades. Quem me dera recuar, quem me dera voltar ao nada-tudo, à morte de ser parido.

Os Repositórios

Temos um mau hábito muito grande: o de criminalizar outrém, ou reorganizar os cosmos. Há em nós a constante culpa, um recalque ou atormento que nos transborda, O líquido do reconhecimento escoa-nos cérebro abaixo, mente acima e perfura-nos a alma. Como uma seta, e que seta, pois não sabemos mas existe, e se não, fazemo-la existir. São os repositórios e a nossa condenação à tão temida iconoclastia, Os pedaços de terra ou pedra a que, hereges rezamos, pela morte ou pela sorte, Pela vergonha ou pelo deleite. São os repositórios e neles o nosso deus, e nós mesmos, Os nossos mitos, fados e religiões, na sua complexificação do simples, Na sua simplificação do complexo. E são os repositórios, com função dupla: a de deixar de ser a coisa para ser o mito, Ou de ignorar o mito, para se cingir à condição de coisa. Somos entes doentios, uma peste bastante nojenta, é isso que somos.

O Meu Rapto

Imagem
Revelo-me no que me expele daqui, Mediando a ponte entre o eu e o ti. Presença na ausência, constante do inconsistente. É apaixonante este magnifico rapto, Que desde a pedra transformada em gado E desde a moldura apelidada de memória Nos adultera pela hipnose do visual. A frase é um ícone, o parágrafo é um símbolo, E o texto está em constante reverberação (em mim, sim, eu), A Hermenêutica de um devir textual, Que projecta qual cinema mental de imagens Esta nossa Imaginação controlada - temos esse super-poder-, O todo fotográfico que consumamos em nós mesmos: O cérebro como alegoria alucinogénea da vida, Escorrido da tinta preta.

je n'est pas moi

Que serei eu, que não um mero objecto numa frase?  Se não a influência psicológica da outridade em mim? Não sou mais que pensamento como minha própria prova irrefutável, Nem menos do que o que me circunda, por mim apreendido e engolido. Eu não sou eu, je n'est pas moi, je n'est pas moi-même. Sei que existo porque de mim saio, enquanto permaneço. Um concreto de um abstracto ou o vice-versa de um ser-estar-ficar. Sei que sou porque aqui fico... numa constante reverberação do ânimo. Mas o ser deixa de ser quer quando se conjuga, quer quando se predica, E predicar é fatalizante - e eu não sou eu mesmo. Nem o mesmo.  Foi, sem dúvida, a dúvida que menosprezei que me provou. ...

A Recoleta

Invernos inversos às anteriores insurreições: Perdoem-nos os macabros pecados da gentileza De oferecer em céu o que não vemos na terra. Desdenhem-se os artefactos anti-factos, Que reluzem na sua sumptuosa sinfonia de beleza. Descobrem os infortunados reencarnados na destreza. Telhados de vidro cobrem árvores na sua limitação, Já pretendemos contornar em círculo as barreiras da finitude Preferimos proferir em silêncio os actos da cabalidade Ignoramos as inocentes descobertas iluminadas, Das infinitas galerias, de inúmeros andares andados. Num passo o contratempo, no espaço o contrapasso.