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A mostrar mensagens de março, 2013

Metrómono

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De cima, a cidade é a calma. A calma não deixa espaço ao vazio: Não há insegurança sem vazio; Não há deus que nos preencha. A cidade é a calma. Não há uma mancha caótica Na natureza da indústria, Os esgotos têm águas límpidas. A cidade é a calma, A Natureza é a reversão, Nós somos o dentro-fora. Nós estamos mas não devíamos.

Casa Assombrada

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Lavo o tempo levado pela des-culpa, Toda uma catarse química, uma economia corporal, Um desejo de desvirgular as virgulas do nosso crepitar. As árvores entravam-me sombrias pelas janelas, A lareira parecia desmaiar lentamente de hipotermia. Não sei se acabei só ou não: não sei se sinto a minha presença sequer. Corpos dançam mecanizados num coma morto-vivo Com abóboras ardentes em vez de cabeças, Engoliram-me com as labaredas que cuspiam dos cigarros. Fechei os olhos para me sobreviver, senti uma mão no não-sentir, Esfreguei-a às minhas mortes tocantes, vi criação e inutilidade juntas: Espero não te ter esfriado o sangue com o meu corpo obscurecido.

O Mito, Ontem

Não posso deixar de achar que os nossos avós viviam um matrimónio com os seus contos. Uma determinada quantidade abusiva de pormenores detalhados ao pixel para com os quais tinham um pacto. Um laço inquebrável entre contador e história, uma fidelidade que dá inveja aos céus. Era essa a magia que nos prendia: a do compromisso que se susteve durante gerações e gerações até romper. Mas o que é que mudou?

Liebe und Kunst

A reviravolta no conto contou-me E informou a infância interior Desenvolve-te depressa, Demasia-te adulto. O Amor é fraqueza, Viver é complicar o dentro e o fora, Não deixo do pensar. Foi o pulsar que começou a imitar, A vida que representou a arte, Em repositórios de fé e afecto, Que me afectam as chagas cegas Do coração ou das ruínas rotas dele.

Mafalda

Na demanda pela dignidade, tu deixaste-me pela tua humanidade. Mas cingiste-te ao ser-humano do Ser Humano, prendeste-te dentro do corpo e deixaste-me só, na guerra contra os mais Humanos dos humanos, as criaturas mais endeusadas presas à terra. Bati-me contra aqueles que nos deram as palavras para as coisas. Os cientistas que finalmente decidiram pegar num Ser Humano e vê-lo como ser-humano e dissecar cada pedaço do corpo, da alma e da mente. Alguns deles perderam-se no caminho recto: o bem é um caminho recto, é preciso entortar o Ser Humano, perder o ponto de vista da luz no cansaço, na fadiga de lutar para nada ter; viver para não criar ou viver para destruir, viver no aturdimento do caminho recto ser múltiplo e querer percorrer toda a sua multiplicidade. E pusémos o imaterial em recipientes, chamámos-lhes memórias, sentimentos, obsessões e religiões. E pusémos imitações de latão a guardar os recipientes, demos-lhes funções, nomes e marcas. E pusémos os robôs a matar-nos, e

5 breves notas

bem / mal Todos os fracassos que vivi ensinaram-me que não existe bem ou mal, melhor ou pior, mas apenas o poder da superioridade que nos estrangula na sombra. Na sombra lançada por detrás da luz daquele farol de esperanças; lançada pela porta que nos é fechada por aqueles que engolem a chave e as cópias.  imortal / morto Um dia falaram-me de alguém que nunca vi nem conheci - apenas ouvi. Parece que a morte filtra umas quantas características, inscreve na história os que mais traíram a nossa condição de animais. No fundo, traímo-nos a nós mesmos quando decidimos subir um pouco a nossa fasquia, quando nos considerámos homens. moral O complexo de superioridade inviabiliza bem e mal: vive-se acima da moralidade, do texto e pretexto público, no objectivo de manter um escadote-pedestal sob os nossos pés. Não há lições nem empirismos por experiência-erro, só perfeição ao nosso tortuoso nível. fracasso Por um fim, preciso de meios, e o meu narcisismo advém de cada momento e