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A mostrar mensagens de maio, 2018

O Cofre do Homem Morto

Cruéis frios ventos do mar Que te levaram de mim, Será que vais voltar Se ouvires a minha voz Cantar com as marés O meu amor que nunca morre? Pelas ondas e no azul profundo Vou ancorar o meu coração por ti Dez longos anos, a minha maldição Cantar com as marés O meu amor que nunca morre. Anda, meu amor, sê um com o mar Governa comigo a eternidade das ondas Afogar outros sonhos, sem piedade, Deixa as suas almas para mim Cantar com as marés O amor que nunca morre. Deita a canção que cantaste há tanto E onde quer que a tempestade te levar Vais encontrar a chave para o cofre Nunca separar, nem terminar Cantar com as marés O amor que nunca morre. Selvagem e violento, o ímpeto Que não vai ser contido Nunca agrilhoado ou aprisionado As ruínas que tu custas, As feridas que não saram, O meu amor que nunca morre. Cruéis frios ventos do mar Que te levaram de mim, Será que vais voltar Se ouvires a minha voz Cantar com as marés O meu amor que nunca morre?

Rei Pirata

"A história humana é um evento imperceptível, de um ponto de vista cósmico." — Naufrágio com Espectador , Hans Blumenberg Não houve açoite divino que me tocasse o rancor Flutuei no meu batel como bem me deu na gana Se sofri, não foi por mérito, mas por acaso. É que o meu barquito cortou o oceano em tantos... Que gerou, dos cortes, novos tsunamis, Tantos pobres iates a virar e a tombar o caviar. Aldeias que pilhei e vilas que laminei, Lâminas de água em pescoços só molham, Mas quebraram-se na ânsia do impacto. Não esperaram. Ansiaram. Guilhotinaram-se. Vagueio por águas equilibradas, No que sei e sinto que há, No caminho que se abre para ser seguido. Mas os cortes continuam a fazer caravelas tombar E que lindas velas bordô que aquele ali tinha E que grandes balas de canhão seguem em minha direcção. É o medo do escuro. O medo da bandeira pirata, Que não diz mais que separação, ruptura com o original. Nenhum dos meus marujos é normal, é um barco/circ

Outra promessa numa carta

No meio da podridão, da discórdia e da espiral da demência, recebes outra carta do futuro. O horror é reparar na caligrafia não só familiar, mas tua. "No dia da tua queima das fitas liguei para te dar os parabéns, mas não atendeste. Foi inesperado. Queria saber o que se seguia, para confirmar que não tinhas perspectivas do que ias fazer. Para ser honesto, lembro-me daquela dúvida. Era difícil sair daquela cidade e deixá-la para trás. Era um fardo a cidade ser de tal modo património que os pecados ficaram esculpidos a granito na memória, prestes a accionar sempre que recordas as paredes contra as quais beijaste. Daqui a pouco vais escrever a tua história a pegadas no mundo. Naquela altura, e acima de tudo, queria dar-te um conselho: a casa não é um sítio, mas as pessoas que lá estão. Daqui a pouco, eles vão sempre estar lá.  Hoje, fico feliz por não te ter dado esse conselho, por não ter arruinado a surpreendente ruína. Por nunca teres estado preparado e ainda assim, continuament

parkour

O génio só tem lugar no que tem de pragmático, não no que tem de ético. Uma vez que os grandes desenvolvimentos levados a cabo por um génio dependem do pensamento desviante (do inesperado, em função de dar um grande salto em direcção ao futuro), os seus comportamentos não devem ser punidos por terem sido, se não a causa, um acidente no percurso ao desenvolvimento. Não é função do génio pedir que lhe sigam os comportamentos, mas que lhe admirem a forma como devolve arte ou técnica (no modo como as enaltece) do vocábulo primeval e polissémico technè . Estes desenvolvimentos não são políticos, são estéticos ou tecnológicos, fazem a sociedade progredir sem ligar a quem dela faz parte. É, portanto, inútil associar a vida do génio ao papel de um modelo social, pois a sua única utilidade tem a ver com a sua finalidade, é o que o génio tem de prático. A sua vida foi um percurso em torno do desenvolvimento. Acabar, não com o culto do indivíduo, mas da própria ideia de indivíduo, é esperar que