Φpocrisia.

Acordo no hospital e quero um cigarro turquesa. As nuvens roxas da última foda cobrem todo o meu corpo. "É engano, não é suposto, deixe-me ir." Mas já não me apercebo de mim mesmo. Os outros andam às voltas na mesma obsessão, macaquinhos em camas de mentol.

Sob vigilância, tenho vivido no sonho de me agarrar a quem nunca mais me solte. E a mente papagueia frases que jurei não voltar a pronunciar. O meu outro lado, o verdadeiro, o gerado-não-inventado repete, por vezes falando, outras pensando "ele não existe, ele nunca existiu". Os outros aglomeram-se à minha volta e saltitam danças demoníacas.

Saltei da maca para a mesma monocromia. Calçado, atento a um novo reconhecimento facial. Quando o espelho reflecte a outra face, reparo que dessa boca caía um cigarro, num corpo de marcas autocomiseradas. Estava escrito na testa "tenho nojo de mim".

Queimava um diário, sentia-se SUPER!HIPER!MEGA! suicida: revelava anos perdidos, juventude de lágrimas que eram bonitas mentiras colorindo a feia verdade. Até ao dia em que decidiu morrer para descobrir que não tinha vida. "Quero ser virgem e puro, honrado e bom, quero ser uma puta do século XXI". 

Fartei-me do espelho como quem deixa de comer bolachas, em vez da boca eram os meus olhos que estavam secos. Só esta dramatização me fez livrar das vozes mentais, não há sinais de paz quando todo o mundo se joga fogo e se atira das janelas para voar em tapetes de bolhas de sabão.

Já foram demasiados embustes, tomou-te a Φpocrisia, uma sobrecarga de cinismo, agora és tudo o que odeias. Farto dos teus ensinamentos, uma mania de me pregar ao que devia ser: mas eu não estou um prego para uma cruz.

Conheço as merdas que Miguel Angelo podia esculpir e desdenhar.


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