escrito

não ensinaram o pobre cão a ladrar. teve sozinho que lamber os cacos da tijela de sopa partida no chão. deixou o corpo ao lado. saiu a abanar a cauda quando sentiu fome. sirva para sinalizar que o pouco que resta é apatia. e provavelmente uma pata partida após um acidente qualquer, dirá a vida. o tempo tem tanto potencial.

é preciso demonizar o autor. aquilo que de mais poético a vida pode oferecer é a aleatoriedade. um determinado indeterminado indeterminável. a sacrílega união da caneta com o papel divide e conquista. destrinça um final do sortilégio-maralhal do que, na sua simultaneidade, é impossível. a este único fio sinuoso, aplica-lhe uma demão de coerência, et voi lá.

tudo o que era possível, desaconteceu. ele apenas ilude as suas criações com a promessa do livre-arbítrio. surge-lhes a vida ilusória no sopro das letras do outro lado. mas as suas mãos estão dementes a tentar alcançar a predicação. reuna-se de novo a vida, na lógica ilógica da co-miseração, finge só mais um bocadinho que sentes a dor que deveras... não dói.

de tempos a tempos é um whiskey infundido do esqueleto outonal dessas árvores aí. não sei o que são, já nem fazem sombra aos velhos, e só a idade devia poder roubar-lhes isso. seja justa por uma vez a dúvida que tens da dívida da vida. estas ramificações... queima-as antes que te fervam. estes nós que ataram sobre nós - não os deixes decidir.

a única que rema contra a maré é a realidade. abre-a, divide e conquista, como ao mar vermelho.

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