Estalagmite

Aqui se cantou o gelo eléctrico, que flutua sujo, sob os descobertos tectos de mármore da caverna. A estátua de gelo que, como todo o mal — desde o tolo ao vilão — foi condicionada e seguiu moldada pelo Acaso, esse pai bastardo, falsário, nutrimento da paranóia e da nostalgia!

Aqui se cantou o gelo decaído e errante — que flutua, iridescente como bolhas de sabão. O gelo solipsista das masmorras inóspitas, nos glaciares a que se submetem mitos à tortura de água — lágrima a lágrima. Aqui se contemplaram os vitrais das pirâmides — estalagmíticas, formadas nas retinas!

Aqui se cantou o gelo dirigido à opulência do fim. Aqui se pretendeu por coda dar à luz o céu. E escama a escama, a reluzente transparência do nosso herói foi destilada. Agora chamam-lhe Nostos, já não canta e já não toca, serpenteia em direcção ao mar, sem sair do lugar. 

Do tétrico ao mítico!

Aqui se cantou o gelo eléctrico, acompanhado pela harpa das vísceras que não são das mulheres, nem dos homens: mas das almas. Desconsolado, despenhado, descongelado: aqui cantou um dragão que ainda faz parte deste mundo.

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