O Terceiro Plano

De onde estás vês-me em cada espaço branco, no sorriso de cada letra, no desgaste com que interpretas cada palavra. No vazio onde estou, expiro símbolos mortos, ideias paradoxalmente impossíveis, mundos vãos. Mas o nosso sítio toca-se neste possível-impossível mútuo, nesta infinidade na finitude de cada um dos lados. E estes olhos olham-se assombrosamente, na fantasmagoria do saber e na persistência da ignorância. Quem está aonde? e quem é o quê?

Para quê esta linha ténue por que ambos caminhamos qual corda-bamba? Porquê estes mundos separados que no fundo são o mesmo? Se eu disser que escrevo, saberás o que eu escrevo, ou entenderás que é isto? Esta catarse já matou demasiados por curiosidade, na desolação de viver sem saber. Entristece-me conhecer a complicação a que chegámos: por vezes, as palavras não são as coisas, mas mantêm a sua beleza na tensão ser-não ser.

Este imaginário é um vidro inócuo, transparente e translúcido, uma barreira virtualizada pelos deuses a quem roubámos este fogo apaixonado de escrever. Pela técnica que nos separa e une nestes precisos momentos. Sou o que não sou expelido, mas continuas a ser o mesmo, por detrás de uma porta fechada, espreitas pela janela bem aberta que passei a ser.

Durmo no teu despertar ou será que estás morto por entre estes aparentes-crípticos grafemas?
Cega-nos o pano óptico-panóptico representado neste meu olhar (de olhos fechados) sobre teus olhos bem assustados.

Sempre aconteci, desde que me sei. Ou ter-me-á acontecido, não o sei.


Comentários

Mensagens populares deste blogue

Estalactite

Antígona de Gelo

Furacão de Esmeraldas